
E não há como escondê-los embaixo de um tapete enfeitado que agrade o nosso visitante. O tapete há de rasgar a qualquer momento, e há de revelar o que não limpamos simplesmente por medo de ficarmos a sós conosco mesmos. Evidentemente, não há só sujeira. O nosso museu interior nos revela imagens preciosas do quanto servimos ao outro, do quanto amamos, do quanto nos emocionamos com cenas delicadas da vida que emprestaram poesia ao nosso sonho e que acalentaram o nosso convívio. É o que somos: perfeição e imperfeição, dualidade. E a vida madura talvez seja a incansável busca em fazer com que as virtudes vençam os vícios e que o museu esteja, enfim, digno de ser visitado. Nada de enfeites, nem disfarce. Limpeza. A sós conosco mesmos, somos capazes de nos limparmos para que o dor desagradável não desagrade nem a nós nem aos outros.
Ninguém gosta de ser usado, amigo. E ninguém de fato gosta de ter usado alguém. É isso mesmo, ninguém usa o outro impunemente e quem nos pune é a nossa própria consciência. Lá dentro, sabemos que são as trocas, as mãos dadas, a alteridade que nos conferem dignidade...
É esse o convite que lhe faço e me faço. Vencer o medo de estar a sós com os nossos retalhos da nossa tessitura, com os cacos de nossas desconstruções. Sozinhos, mas não sozinhos, por que o amor vive em nós e haveremos de rearrumar a casa e abrir os salões do acolhimento para que sejamos visitados, freqüentados.
É o paradoxo da vida mais uma vez nos surpreendendo. Precisamos da presença do outro a da sua ausência. Precisamos dos sons que habitam o cosmo e do silêncio. Sozinhos e silenciosos estaremos aptos para aplaudir, acompanhados, a nova sinfonia.
( Gabriel Chalita )